Bem aventurados os que conhecem a Palavra e foram ungidos pela graça da Verdade revelada. Impávidos e serenos, eles habitam o reino da verdade eterna e cristalina, acima das mazelas dos comuns, sem se deixar tocar pelos enganos e desenganos deste mundo de sombras.
Essa postura olímpica de quem está acima das incertezas e das dúvidas é típica dos fanáticos e dos convertidos. A tal Palavra pode ser a Bíblia, o Corão, a Torá, o Capital , A Riqueza das Nações, A Evolução das Espécies, ou as obras completas de Freud. O importante é que, uma vez adotada uma chave de explicação do mundo em torno da qual se irmanam os eleitos, estes cumpram o ritual sistemático do congraçamento e da reafirmação mútua, reforçando e cristalizando a certeza da salvação pela inspiração do intelecto ou pelo sopro divino. Os salvos têm a certeza das suas convicções pois elas são as únicas verdadeiras. Eles serão sempre tentados pelos perdidos, que vivem no lodaçal da dúvida, enredados no erro, mas a certeza da salvação (o desejo profundo da segurança do seio materno) torna-os imunes e surdos aos apelos deste mundo confuso. Não há caminho mais certo para a fuga da realidade incômoda, ou seja, para a loucura.
A coerência extrema prescrita por um sistema de crenças fechado em si mesmo é a chave para as portas do céu das certezas. A porta que abre o vão das certezas ideais é a mesma que fecha a abertura para o real. Dois vãos com uma só porta. O caminho para o ideal é a fuga do real: loucura.
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