Vivemos a dualidade entre cérebro e entranhas - "guts", diz o inglês. Conflito entre natureza animal e inspiração divina, paradoxo corpo x mente, divisão entre sistemas límbico e cortical. Formas cultas de expressar a eterna luta entre a cabeça e as entranhas. O frio na barriga ou o calor no coração refletem o desconforto emocional que nos mobiliza a agir. "Só se age para aliviar um desconforto", disse Mises.
Ponderamos com o cérebro, decidimos com o intestino. Convicção e ação vêm das entranhas. Do cérebro, contemplação e dúvida. Por vezes o intestino comanda: decide-se sem ponderar. A falta de tempo justifica a incontinência. A urgência intestinal desconhece a calma.
O conhecimento amplia a visão e reforça a compreensão, mas diminui as certezas. Pensar para formar convicção e acumular certezas. Como? Se a cabeça não pára de agregar dúvidas e pontos de vista distintos. Uma constipação faria melhor.
Quando as crenças se firmam em convicções, correm o risco de se empedrar como certezas. Daí é um passo para a intolerância fanática - patologia da crença - loucura.
E então a cobra engole o rabo. Pois a sabedoria não pode ficar só no conhecimento. O saber requer prática, vivência, experiência, aplicação - ação, em suma. E a ação requer mobilização sempre, convicção às vezes. Ambas, no entanto, entranhadas e viscerais.